segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Coleção de Crônicas | A Crônica


E estamos aqui em mais uma segunda-feira! Para dar uma reanimada na seção Coleção de Crônicas aqui do Livros & Cinema, resolvi postar para vocês uma crônica de Ivan Lessa, um peso-pesado da literatura brasileira que faleceu nesse ano de 2012. Na crônica de hoje, ele fala sobre aquilo que tanto suas obras quanto essa seção mais prezam: a própria crônica! Para efeitos de comparação, ele aproxima a crônica do romance e da autobiografia. Sem mais delongas, aproveitem a incrível crônica de Ivan Lessa!

A Crônica
Ivan Lessa
Crônica, do grego chrónos, tempo, cronicar, feito Tácito, relatar o tempo ou tempos.Por que nós, brasileiros, fizemos do gênero especialidade da casa — feito muqueca de peixe ou tutu à mineira?Eu, pela parte que me cabe — e é pouquíssima a parte que me cabe —, eu tenho minhas teoriazinhas.Primeiro lugar, porque nós trabalhamos bem com poucas armas, isto é, Euclides da Cunha à parte, nosso fôlego literário é curto.Não há nenhum demérito nisso.       Se a América Latina fornece caudalosos escritores, como Vargas Llosa, Roa Bastos e Alejo Carpentier, nós, por outro lado, somos excelentes no pinga-pinga do conto: o próprio Machado de Assis, Lima Barreto, Alcântara Machado, Dalton Trevisan, Clarice Lispector, Rubem Fonseca.                                                                                                                         Segundo lugar, porque nós temos consciência da extraordinária violência com que o tempo vai levando as coisas e as gentes, daí a necessidade de registrar, de alguma forma, o que se passou e passa no âmbito pessoal e intransferível.                                                              Terceiro lugar, em conseqüência disso que acabei de falar: somos muito pessoais, vemos e vivemos muito a nossa vida e a celebramos quase que no próprio instante em que ela se passa.                                                                                                                                                      A crônica é a nossa autobustificação, por assim dizer.                                                                  Ou, em termos da realidade atual: é a nossa autonomeação para assessor disso ou secretário daquilo outro.                                                                                                                                                E em quarto e último lugar: dinheiro. Não há motivo nenhum para se ficar encabulado.Quem não escreve por dinheiro não é digno da profissão.Um romance vende cinco mil exemplares e o autor, com alguma sorte, pega o equivalente a uns tantos salários mínimos.Se dividirmos tempo gasto no trabalho e na vida de estante do livro, vai dar nisso mesmo: salário mínimo.O cronista, por outro lado, mesmo mal pago — e quando é bom não é esse o caso —, tem uns cobres garantidos no fim do mês, se o empregador for bom pagador.                           Conseqüentemente: aí está, viva e atuante, a crônica do cronista brasileiro.Pouco importa que o cronista ou a cronista limite-se a relatar seu encontro no bar ou sua ida ao cabeleireiro.Tanto faz que seja elitista ou literariamente limitador.E daí que tenha menos profundidade que mergulhadores mais audazes como Milan Kundera e Marion Zimmer Bradley?                                                                                                                                                 A crônica vai registrando, o cronista vai falando sozinho diante de todo mundo.
Ivan Lessa
E aí, o que acharam da coluna de hoje? Registrem suas opiniões nos comentários! Até a próxima!

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